domingo, 10 de abril de 2011

Como anda a política de saúde mental no Brasil?

Por Mabel Dias

A Reforma Psiquiátrica no Brasil tem seu início nos anos 70, com o objetivo de oferecer um tratamento digno e humanizado àquelas pessoas que sofrem de transtornos mentais, eliminando gradualmente as internações visando à integração delas a vida em comunidade. Para substituir o sistema de internações nos manicômios foram criadas alternativas, como os Hospitais Dias, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), entre outros serviços, que pudessem oferecer melhores condições de tratamento e um acompanhamento adequado a cada paciente.

É sabido que muitas famílias abandonavam o parente que sofria de transtorno mental nos hospitais psiquiátricos. Algumas até faziam isto para ficar com dinheiro de aposentadoria ou outro beneficio que o doente recebia. Tais fatos geraram denúncias e ações de órgãos do Judiciário, como o Ministério Público, para que esta situação chegasse ao fim. Este abandono fez com que milhares de pessoas ficassem para sempre naqueles locais escuros, sujos, e sem nenhuma assistência, chegando até a morrer lá mesmo. Sabemos muito bem como as pessoas acometidas de transtornos mentais eram tratadas. O filme “Bicho de sete cabeças” ilustra bem esta realidade. Diante de todo este quadro e das situações precárias em que funcionavam os hospitais psiquiátricos, a reforma psiquiátrica era mais do que necessária acontecer.

Vários movimentos foram realizados para se mudar a prática da “hospitalização”, e em 2001, foi aprovada a Lei Federal de Saúde Mental (nº 10.216), que regulamenta o processo de saúde mental no Brasil. Porém, ao passo que a reforma aconteceu, os serviços alternativos que foram criados para atender estes pacientes, e dar-lhes condições de lidar bem com a doença e retornar ao convívio social normalmente, parecem não terem sido devidamente estruturados e os profissionais que lá trabalham não terem sido treinados para passar orientações adequadas às famílias.

Nos CAPs, por exemplo, o paciente que entra em crise, pode ficar lá durante o período de 7 dias, e em seguida volta para casa, mesmo que não esteja totalmente bem. Ele deve voltar ao serviço uma ou mais vezes por semana, para continuar pegando a medicação e participando de atividades terapêuticas para sua completa recuperação. As famílias, na maioria das vezes, não estão preparadas para cuidar de seus doentes. E não é fácil cuidar de uma pessoa com transtorno mental, principalmente, em crise. A esquizofrenia é uma das doenças mais difíceis neste rol. O poeta Ferreira Gullar tem dois filhos que tem a doença. Um deles já é falecido. O outro quando entra em crise, fica agressivo, e quando está bem, não quer tomar a medicação. A família pode ser responsável pela melhora como pela piora do paciente. E se não for devidamente orientada, e até acompanhada por psicólogos, na primeira oportunidade, procurará internar em algum manicômio seu parente. Ferreira Gullar, em entrevista à revista Época em 2009, dizia que não queria internar seu filho, mas que muitas vezes não tinha outro jeito, pois não sabia lidar com a situação. Por isto, como estes serviços alternativos podem também ajudar os familiares a cuidar de seus doentes, para que eles não recorram aos manicômios que trazem lembranças horríveis e que não vão resolver o problema?

Muitos profissionais dizem que quando o paciente adoece a família também adoece. Sendo assim, onde está o acolhimento e orientação a esta família doente, que quer cuidar de seu parente, mas que não sabe lidar com a situação?? Se os serviços como os CAPs, Hospitais Dias e outros que propõem um tratamento humanizado, não funcionarem adequadamente, o ciclo de internações que é combatido pela Luta Antimanicomial, pode voltar a acontecer. E aí todo o trabalho realizado, desde os anos 70, terá sido em vão. As políticas de saúde mental devem discutir e atualizar todos os meios de acesso da população às informações, visando melhorias para os usuários e facilitando o processo de inclusão e inserção social. Sendo assim, é preciso estarmos atentos para que aquilo que está no papel da Lei de Saúde Mental seja devidamente colocada em prática. Integralmente aos doentes, à família e a toda a sociedade.

5 comentários:

  1. Olá Flávio!
    Vim agradecer sua visita, no meu espaço é sempre bem vindo quem vier por bem.
    Estamos num bom momento para começar a lidar de forma mais humana com qualquer situação de desequilibrio a favorecer a todos os níveis, estratégias de inclusão social.

    Abraços

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  2. Pois então vamos começar por abraçar esta causa e lutar por ela, quem mais se habilita!? =D

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  3. Eu concordo plenamene com o movimento anti-manicomial, não faz o menor sentido enjaular pessoas e tratá-las pior do que bichos. O único intuito desse método carcerário é esconder da sociedade as pessoas que sofrem de trantorno mental, fingir que elas não existem. Mas elas existem!

    Um livro brilhante que trata dessa questão é O ALIENISTA, é fantástica a forma como Machado de Assis coloca o ponto de vista da loucura. A obra se passa no séc XIX na cidade de Itajaí, no Rio de Janeiro, e retrata a burguesia hipócrita num texto repleto de ironias e críticas. O personagem central da trama chama-se Simão Bacamarte, médico psiquiatra que cria teorias sobre a loucura e funda um sanatório para a cidade, chamado casa verde. Pouco a pouco, o Dr. Bacamarte analisa todos os habitantes da cidade, faz diversas internações, altera sua teoria da loucura, liberta os 'loucos' e assim por diante.

    Num dado momento quase toda a população está na casa verde e isso gera muita indignação e revoltas na cidade. Por conta de tamanha confusão o Dr. Bacamarte revisa sua teoria da loucura e constata que ”louco é ser equilibrado o tempo todo". O Dr. Resolve então libertar todos que estão encarcerados na casa e se muda pra lá onde vive isolado por dezessete anos até que a morte venha buscá-lo.

    No fim das contas provavelmente Simão Bacamarte era o único louco da cidade, apesar de dizer em alguns momentos que a população toda já tinha o ”germe da loucura” sob a forma latente, penso que isso não passava de loucura da cabeça dele. Por fim constatamos que o normal é ser um pouco louco.

    Mas além de nos fornecer esse brilhante ponto de vista sobre a questão da "Normalidade X Loucura", Machado de Assis ainda nos incita a questionar o que fazer com nossos "loucos", prende-los ou integrá-los à sociedade? Acredito que a própria história da civilização humana já deixou bem claro os prejuízos do cárcere e os benefícios da socialização e evolução assistida dos pacientes psiquiátricos.

    Basta ter bom-senso e olhar à sua volta, hoje em dia portadores de síndrome de down, autistas, bipolares, e até psicóticos ou esquizofrênicos, tendem a levar uma vida normal dentro de suas limitações. Eles trabalham, namora, se casam, têm filhos, e se forem tratados e bem acompanhados nada os impede de levarem uma vida normal na sociedade.

    Quanto à política do CAPS eu acho que na teoria é um sucesso (assim como todo o SUS), mas claro que se leva um tempo pra que se torne plenamente organizada, é preciso sempre ajustar aqui e ali. Além disso é preciso -como você mesmo disse- que a família esteja presente junto a esse indivíduo, que se empenhe em ajudá-lo, em compreendê-lo, que leia sobre o trantorno dele, que converse com profissionais de saúde e com familiares de pessoas que passam pela mesma situação. A família pode ser uma importante ferramenta na melhora ou na piora desse paciente.

    Gostei muito da postagem. Abraço.

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  4. Gracias pelo comentário, mas todo credito é da minha namora ( Mabel Dias), eu apenas divulguei. Pois isso é um alerta para melhoria de todos os serviços públicos e principalmente daqueles que mais precisam como é o caso dos doentes mentais.

    Abraço.

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